17 junho 2007

"(...) O Consumo constitui um mito. Isto é, revela-se como palavra da sociedade contemporânea sobre si mesma; é a maneira como a nossa sociedade se fala. De certa maneira, a única realidade objectiva do consumo é a ideia do consumo, a configuração reflexiva e discursiva, indefinidamente retomada pelo discurso quotidiano e pelo discurso intelectual, que acabou por adquirir a força de sentido comum.
A nossa sociedade pensa-se e fala-se como sociedade de consumo. Pelo menos, na medida em que consome, consome-se enquanto sociedade de consumo em ideia. A publicidade é o hino triunfal desta ideia. (...)"

"(...) Ao dizermos que a sociedade de "abundância" é o seu próprio mito, compreende-se que ela retoma à sua conta, em nível global este admirável "slogan" publicitário que poderia servir de exagero: "O corpo com que sonha é o seu". Uma espécie de imenso narcisismo colectivo leva a sociedade a confundir-se a absolver-se na imagem que oferece de si mesma, a convencer-se de si mesma da mesma maneira que a publicidade acaba por convencer as pessoas dos seus corpos e dos seus prestígios - em sumo, como dizíamos antes, a "autoprofetizar-se". (...)"

"(...) O povo contempla-se no espelho. É também o que se passa com as celebridades, com as vedetas e com os "heróis do consumo": "Outrora os heróis representavam um modelo: a celebridade é uma tautologia... O único título de glórias das celebridades é a própria celebridade, o facto de serem conhecidas... Ora, semelhante celebridade reduz-se à versão de nós próprios enaltecida pela publicidade. Ao imitá-la, procurando vestir-nos com ela, falar a sua linguagem, apresentar a sua aparência, nada mais fazemos que imitar-nos a nós mesmos... Ao copiarmos tautologias, também nós nos tornamos tautologias: candidatos a ser o que somos... procuramos modelos e contemplamos o nosso próprio reflexo.". E quanto à televisão:"Tentamos conformar a vida do lar com a imagem das famílias felizes que a televisão nos apresenta; ora, tais famílias limitam-se a ser a síntese divertida de todas as nossas". (...)"

Jean Baudrillard in "A Sociedade de consumo"